Marcos Ramon

Para entender o nosso tempo


Às vezes tenho a sensação de que o meu tempo é o mesmo de todas as outras pessoas, em qualquer época, em qualquer circunstância. Mas claro que não é assim. As coisas mudam, os modos de viver e entender a realidade mudam, as pessoas são sempre diferentes em cada cultura ou momento histórico.

Esses dias vi uma pesquisa que alertava para o fato de que a maior parte dos estudos de psicologia social são realizados com estudantes das Universidades. E por que isso é ruim? Porque desconsidera a diversidade de pensamentos, de jeitos de viver e entender a existência. Ainda assim, esses estudos, realizados com estudantes de classe média que passaram quase a vida inteira em grandes cidades, propõem o entendimento da psique humana, apontando para dados e informações que dizem respeito a todos nós. Como você pode imaginar, nada mais ingênuo. Mas é assim que as pesquisas são feitas.

Esse é o problema das generalizações. A maior parte delas, especialmente no que diz respeito às questões sociais, vão ser feitas tendo como ponto de partida uma realidade que não é passível de ser generalizada. É verdade que estamos criando uma cultura global artificial; um ambiente em que consumimos as mesmas coisas, discutimos os mesmos assuntos, somos impactados pelas mesmas ideias. Mas ainda existe exclusão demais no mundo para acreditarmos que esse sonho de uma cultura única1 esteja realmente próximo de nós.

Como na maior parte das vezes, temos que nos conformar diante do fato de que as coisas não irão mudar. O difícil é aceitar que ser diferente não é sinônimo de ser errado. Por mais que estejamos sempre diante de uma defesa clara da tolerância, o que vemos no dia a dia não passa nem perto dela. Para entender o mundo atual, precisamos primeiro desacreditar de nós mesmos. Sem isso, iremos sempre adotar uma postura agressiva e belicosa, o que gera mais incompreensão, mais desinformação, mais infelicidade. E ninguém quer viver em um mundo assim, ou quer?

Ilustração de Virginia Mori
  1. Eu sei que nem todo mundo vê isso como utopia. E talvez seja mesmo o oposto. Mas as sociedades ocidentais democráticas defendem abertamente a perspectiva de que existem alguns valores bons (os ocidentais) e outros ruins. Nesse sentido, o que a maioria de nós busca, mesmo que indiretamente, é um mundo em que possamos, se não falar a mesma língua, pelo menos nos entender aceitando como básicos os mesmos princípios sociais. 

Marcos Ramon

Marcos Ramon

Professor no Instituto Federal de Brasília, pesquisando ensino, estética e cibercultura. Lattes | ORCID | Arquivo
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Marcos Ramon / Professor de Filosofia, pesquisando estética e cibercultura.

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