Marcos Ramon

Vestígios


Esses dias eu estava arrumando uns papéis para jogar fora e acabei encontrando algumas coisas que escrevi faz muito tempo – da época em que eu ainda escrevia no papel. É curioso esse tipo de encontro, porque nos deparamos com uma versão de nós que já não existe mais. Eu não lembrava quando tinha escrito aquelas linhas, mas sim, era a minha letra, e existe algo que me liga ao que estava escrito no papel, ainda que não conseguisse identificar com certeza o que era.

Naquele amontoado de folhas que não consegui jogar fora, ainda que não tivessem nenhum valor, e mesmo que eu nunca vá utilizar aquilo para nada, existe um pouco de um eu que não existisse mais, mas que sobrevive por esses vestígios.

Acho que é por isso, mesmo que de forma inconsciente, que eu guardo ainda tantos cadernos, tantos textos que escrevi à mão: porque me encontro às vezes comigo nessa versão que não existe mais. O curioso é que não tenho a mesma sensação quando encontro um arquivo no computador, ou um texto em modo rascunho em algum app. Não estou ali, não sou eu ali, ainda que seja tudo parte do mesmo tipo de experiência.

Que falta vai nos fazer a materialidade, quando não tivermos mais resquícios dela…

Marcos Ramon

Marcos Ramon

Professor no Instituto Federal de Brasília, pesquisando ensino, estética e cibercultura. Lattes | ORCID | Arquivo
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Marcos Ramon / Professor de Filosofia, pesquisando estética e cibercultura.

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